Ainda a Celeuma da Tarifa Brasileira

Roberto Pereira D´Araujo

  • O Ilumina tem sido por quase 30 anos uma das poucas instituições que, sem interesses comerciais, monitora a evolução da tarifa de energia elétrica brasileira.
  • No período que se inicia em 1995, o Brasil adotou um modelo de base mercantil e com tendência à privatização.
  • A ANEEL, agência reguladora do setor, sem explicações, retirou da base de dados de tarifa os valores anteriores a 2003.
  • Não ocorreram alterações de modelagem suficientes para que justifique essa ausência de transparência. Mesmo que houvesse, a responsabilidade continua a ser da Agência.
  • O próprio Instituto já solicitou explicações, mas nunca foi respondido.
  • Como, na realidade, a “tarifa” só é mostrada como a receita mensal da distribuidora dividida pelos MWh vendidos ao setor residencial, é preciso salientar que, na verdade, o valor é uma receita média por MWh do setor residencial.
  • Na atual configuração da página da ANEEL, não há como se obter a tarifa média residencial para o Brasil para o período anterior a 2003. Por isso, decidimos analisar um caso em separado, o da LIGHT – Rio. Mas, é preciso deixar claro que há diferenças significativas entre estados.
  • Se qualquer pessoa ou instituição desejar estudar os anos de 1995 – 2002, terá que recorrer a uma planilha separada e sem o detalhamento do período posterior. Ver seta vermelha abaixo.

  • Dada a dificuldade, decidi refazer o estudo mostrando o que realmente ocorreu em todo o período 1995 – 2022 recorrendo a dados do IBGE sobre a inflação, dado que também não consta nas tabelas da ANEEL.

  • O gráfico acima mostra duas curvas: A vermelha é o valor da “tarifa” expresso como a receita média por MWh vendido a cada mês ao setor residencial.  A azul é o valor da “tarifa” de janeiro de 1995 sendo atualizada mensalmente pelo IPCA do IBGE (inflação oficial).
  • No primeiro trecho em azul, a seta aponta o dado de janeiro de 1997. O valor correspondente é R$ 149/MWh para a curva vermelha e R$ 109/MWh para a curva em azul. Portanto, em janeiro de 1997, já ocorria um aumento de 37% acima da inflação.
  • O trecho seguinte, em amarelo claro, é o período pós racionamento quando o consumo total se reduz em 15% comparada à tendência anterior. O valor da tarifa atinge R$ 487/MWh, enquanto a tarifa corrigida pela inflação valeria R$ 202/MWh. Uma elevação de 140% acima da inflação.
  • O trecho em cinza é um período em que a tarifa oscila entre R$ 400 e R$ 500/MWh reduzindo a distância para a curva azul.
  • Finalmente, o período em vermelho mostra a adoção da redução tarifária através da medida provisória 579 e da lei 12783 de 2013. Após uma passageira redução, a tarifa dispara posteriormente e, ao final, o valor de junho de 2022 mostra uma elevação de 109 % acima da inflação. A grosso modo podemos afirmar que pagamos o dobro do que pagávamos em 1995.

Existem explicações para essa evolução. Já fizemos várias postagens sobre isso, mas, não custa repetir. 

  1. No primeiro período, fruto do anúncio de privatização da Eletrobras no governo FHC, não houve investimento suficiente para suprir um mercado que crescia a 3,5% ao ano. Resultou em racionamento e aumento de preço.
  2. No período seguinte, consumo 15% abaixo da tendência anterior, térmicas do Plano Prioritário de Termoeletricidade contratadas, mas sem gerar. Mercado livre captura preços muito reduzidos pelo modelo vigente e o mercado cativo, principalmente residencial, paga a conta. 
  3. No terceiro período hidrologias recordes ocorrem em 2009 – 2010 – 2011. Acumula-se oclusamente a falta de investimento do mercado livre, tal a tendência de preços baixos advindos do modelo e da singularidade brasileira.
  4. Finalmente no quarto espaço de tempo, resultado de algumas hidrologias mais baixas, mas não inéditas, mais térmicas contratadas e, infelizmente, ainda insuficiente investimento em eólicas e solares, fazem a tarifa explodir. Fruto do desinteresse do capital privado, as únicas hidroelétricas construídas foram os 16 GW das parcerias oferecidas pela Eletrobras. A maioria das hidro privadas ou foram compradas prontas ou feitas em parceria com estatais. Vejam a geração térmica no mesmo período.

Para encerrar, é preciso focar nossa atenção na ineficiência e falta de transparência da Agência Reguladora. Esse assunto não tem merecido a atenção da sociedade.

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