Bem melhor, mas…

Em primeiro lugar, o modelo é infinitamente melhor do que o mercantil. Na nossa opinião é extremamente positiva a proibição do self-dealing, a compra de energia por leilões, a volta do poder concedente para o MME e a licitação de novos projetos pela menor tarifa.


Entretanto, ainda temos dúvida quanto a necessidade de se criar uma empresa estatal para exercer o planejamento, pois, na nossa visão, o planejamento deve ser feito pelas empresas a partir da exigência da consideração do longo prazo. Não era um local que estava faltando, mas sim uma coordenação. A Eletrobrás fez esse papel durante anos com o GCPS.


Outro ponto diz respeito às diferenças tarifárias que poderão ocorrer nas distribuidoras que não forem obrigadas a interromper seus self-dealing em função daquela obrigação de não romper contratos. Ora, é evidente que essas distribuidoras terão tarifas maiores do que as que não tem auto-contratação. Os consumidores dessas áreas poderão entrar na justiça exigindo isonomia.


Outra preocupação é a situação de sobras de energia concentrada nas mãos da Eletrobrás. Não parece justo na situação atual descontratar ainda mais o mercado e exigir que a empresa se ajuste via preço na busca da recuperação de contratos. É evidente que o grupo estatal entrará em desvantagem no Pool.





Os principais pontos (Globo 12/12)


O Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) passa a ser autônomo e seus diretores terão mandato de quatro anos, renovável por igual período.Dos cinco diretores, dois serão indicados pelos agentes de mercado e três, pelo governo, incluindo o presidente do ONS.


Criação da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), que vai substituir o Mercado Atacadista de Energia (MAE), encarregada das negociações de longo prazo com as empresas do setor.


Criação da Empresa de Pesquisa Energética, responsável pelo planejamento de expansão do setor, e do Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico, que acompanhará as condições de atendimento por cinco anos.


As distribuidoras somente poderão comprar energia por meio de licitação para garantir o preço mais baixo para o consumidor.


As empresas não podem mais fazer autocontratação (com isso, a Light comprou energia mais cara de uma termelétrica do mesmo grupo de seus acionistas).


As distribuidoras formarão um pool para comprar energia, de forma proporcional ao seu mercado.


As novas usinas hidrelétricas terão de ter licença ambiental antes da licitação.


Vencerá as futuras licitações o investidor que oferecer o menor preço. Das usinas relacionadas pelo governo, o investidor escolherá qual quer construir, e o governo estabelecerá a quantidade de megawatts.


O Ministério de Minas e Energia voltará a ter a função de Poder Concedente, definindo as obras a serem licitadas. Caberá à Aneel operacionalizar os leilões.






Ministério vai centralizar política energética


HUMBERTO MEDINA
LEONARDO SOUZA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA


O governo anunciou ontem novas regras para o setor elétrico que aumentam o poder do Estado e esvaziam o papel da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica).


Segundo a ministra Dilma Rouseff (Minas e Energia), o novo modelo permitirá que as tarifas de energia aumentem menos para o consumidor ou cheguem a cair.
“O novo modelo vai estancar a explosão tarifária”, disse a ministra. “Estamos abortando um processo de aumento tarifário crescente que estava em curso no setor elétrico”, afirmou.


Entre 1995 e 2002, a tarifa média de energia para o consumidor residencial subiu 175%, segundo a Aneel. Entre 2002 e 2003, esse aumento médio foi de 11,28%.
Ontem o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou as duas medidas provisórias que estabelecem as novas regras.


Com o novo modelo, aumenta a intervenção estatal no setor. O governo criará duas empresas: uma para centralizar a comercialização de energia entre distribuidoras e geradoras e outra para planejar as atividades do setor.
Além disso, o governo definirá o nome do presidente do ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico). Hoje, quem escolhe o presidente do ONS é um conselho formado por representantes do setor privado e do governo.


Além disso, o Ministério de Minas e Energia passará a comandar os processos de concessão, seja na área de geração, distribuição ou nas linhas de transmissão.
Questionada sobre o caráter estatizante do novo modelo, que entra em vigor em abril ou maio de 2004, Dilma disse que o planejamento do setor deve ser sempre uma prerrogativa do governo. “Explique-me o que há de estatizante em tentar reconstruir uma função que nunca deixou de ser do governo e que nós estamos retomando?” De acordo com a ministra, “a crítica estatizante carece absolutamente de sentido”.


Segundo Dilma, três características do novo modelo vão impedir reajustes altos de tarifa ou até fazer com que elas caiam.


São eles: a proibição das distribuidoras de comprar energia mais cara de geradoras do mesmo grupo empresarial; a instituição do critério de menor tarifa nas licitações para obras de geração de energia; e a centralização da venda da energia das geradoras para as distribuidoras.


A ministra ressaltou que hoje há sobra de energia e que, por isso, os leilões que serão feitos para compra de energia das geradoras deverão resultar em preços mais baixos para o MWh (megawatt/ hora) do que os que seriam cobrados se os contratos entre distribuidoras e geradoras fossem simplesmente renovados.


Os efeitos do novo modelo sobre as tarifas não serão imediatos. Como os atuais contratos entre geradoras e distribuidoras serão respeitados, o modelo entrará em vigor aos poucos, à medida que esses compromissos terminem.


O governo ainda não sabe o quanto menos a energia poderá subir nos próximos anos, mas, pelos exemplos oferecidos, o preço poderia triplicar.


“A tendência era subir muito. No Nordeste, tem distribuidora que irá renovar contratos nos quais a energia custava R$ 50 MWh e passará a custar R$ 150 por MWh”, disse o secretário-executivo do ministério, Maurício Tolmasquim.
Para Dilma, a sobreoferta de energia atual vai jogar os preços para baixo. “O preço médio das tarifas é bem abaixo desse [da renovação dos contratos].”
As distribuidoras de energia farão leilões para comprar energia. Essa energia será comprada das geradoras por meio da CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica) -órgão que irá centralizar a venda de todas as geradoras e repassará para as distribuidoras por um preço médio.


As licitações para novos projetos de geração de energia serão vencidas pela empresa ou consórcio que oferecer a menor tarifa a ser cobrada do consumidor.
Além disso, quando o projeto for licitado, ele já terá todas as licenças ambientais necessárias para a sua construção. O concessionário que ganhar a licitação também levará o empreendimento já com os contratos de longo prazo para a venda de energia.


Assim, o governo pretende diminuir os riscos para novas obras de geração de energia e atrair investidores privados.





Setor elétrico tem novas regras (FSP 12/12)
Cristiane Jungblut, Monica Tavarese Ramona Ordoñez
BRASÍLIA e RIO


O novo modelo do setor elétrico, apresentado ontem pelo governo, busca reduzir as tarifas para o consumidor e, ao mesmo tempo, garantir investimentos para o setor. Pelas novas regras, as empresas distribuidoras só poderão comprar energia por licitação. Esta foi a fórmula encontrada para garantir um preço mais baixo para o consumidor, já que o valor dessa compra é repassado integralmente para a conta. Isso significa o fim da autocontratação, ou seja, as empresas ficam proibidas de comprar energia de companhias do mesmo grupo do seu controlador, com preços mais altos, e repassar o aumento para o consumidor.


O presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou duas medidas provisórias (MPs) com as novas regras. Lula disse que o Brasil não vai mais sofrer com racionamentos de energia e apagões e prometeu as tarifas mais baixas possíveis. Referindo-se ao racionamento, ele disse que o Brasil não suporta mais sobressaltos:


– Os apagões e o racionamento de energia de 2001 e 2002, que tiveram graves conseqüências para o consumidor, para a situação financeira das empresas e para o desenvolvimento econômico do Brasil, são uma página virada da nossa história. Estão dadas as condições para que não mais ocorram apagões e racionamento em nosso país.


Para atrair mais investimentos e dar segurança aos investidores, quem vencer futuras licitações de construção de usinas hidrelétricas receberá contratos de longo prazo (15 a 20 anos) garantindo a venda da energia que produzir.


As licitações do setor também têm novas regras. Vencerá a empresa que oferecer a menor tarifa. Antes de realizar os leilões de venda, as usinas já terão a licença prévia ambiental.


A ministra de Minas e Energia, Dilma Rousseff, afirmou que o novo modelo tem três objetivos básicos: a estabilidade do marco regulatório, como condição para atrair investimentos; a segurança no abastecimento e tarifas mais baixas.


Ela disse que o Ministério de Minas e Energia assumirá sua função de Poder Concedente, e caberá a ele definir as obras a serem licitadas. Dilma afirmou que essa função está prevista na Constituição e rechaçou as acusações de que o novo modelo é estatizante.


Outra exigência do governo é que as empresas se associem para a compra de energia, que será feita conforme o tamanho do mercado de cada distribuidora. A Light, por exemplo, terá direito a uma maior quantidade de energia do que uma empresa do Nordeste.


Dilma disse que a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) será fundamental no novo modelo. A Aneel ficará encarregada das licitações. Já o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) ganhará autonomia em relação ao governo e aos agentes. O novo modelo prevê ainda a criação da Empresa de Pesquisa Energética, responsável pelo planejamento de expansão do setor, e do Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico, que vai acompanhar as condições de atendimento.


Lula fez questão de ressaltar que seu governo não muda as regras no meio do jogo:


– O novo modelo garante que tudo vai ser feito de agora em diante de forma muito bem planejada. O Brasil não comporta mais sobressaltos. Por isso, não vai faltar energia nem para o consumo atual nem para o desenvolvimento do país.


Empresários e especialistas têm opiniões divididas. Para o presidente da CBIEE, que reúne as 15 maiores empresas que investiram no setor, Cláudio Salles, é preocupante a concentração de poderes no Executivo.


Já o ex-presidente da Eletropaulo e atual consultor da BearingPoint Paulo Feldmann diz que o governo tem mesmo de ser centralizador no setor elétrico, lembrando o caso da falência da Enron, nos Estados Unidos. Segundo Feldmann, as autoridades americanas concluíram, depois da crise, que o setor elétrico tem que ficar nas mãos do governo:


– Eles concluíram que energia é um bem público e que não pode ficar livre nas mãos do setor privado.

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