Custo da energia à vista pode cair 50% em 2015 – Valor Econômico

Comentário: Mais uma inacreditável confusão que surge do modelo adaptado de sistemas térmicos no Brasil. Na realidade misturam-se conceitos distintos esquecendo também das singularidades do sistema brasileiro.

  1. O operador despacha (manda ligar) usinas pelo seu custo de operação. Vamos usar como exemplo uma térmica que gera a R$ 800/MWh.
  2. Quando, sob o ponto de vista do sistema interligado, o valor da água reservada atinge esse custo, ela é acionada.
  3. Nesse momento, o sistema hidrotérmico como um todo tem um valor representado pelo custo daquela térmica.
  4. Se alguma usina hidráulica gera mais do que sua “garantia física”, ela também vale R$ 800/MWh!
  5. Essa situação não deveria ocorrer se a tal “garantia física” não fosse um número abstrato. Muitas vezes térmicas geram abaixo de sua garantia física e as hidráulicas têm que suprir esse déficit. Isso não acontece em sistemas de base térmica porque lá as usinas vendem a energia efetivamente gerada e não um “certificado”.
  6. Essa situação já ocorreu em janeiro de 2014, quando, mesmo com os reservatórios baixos, as hidráulicas geraram acima de sua “garantia física”.
  7. Esse é o conceito de custo marginal usado na operação do sistema.

Outro mundo ocorre no bizarro mercado de energia brasileiro. Ali, duas coisas distintas ocorrem ao mesmo tempo. Usinas que não geraram porque não foram despachadas ou porque não conseguiram gerar a tal “garantia física”, liquidam a diferença do que venderam pelo PLD (Preço de Liquidação de Diferenças), que nada mais é do que o custo marginal.

Mas há também consumidores e comercializadores que têm que liquidar as diferenças de seus contratos e fazem isso também pelo PLD. O problema é que, diferentemente de outros sistemas, o PLD atinge valores irrisórios quando a hidrologia é favorável e nesse momento, é possível pagar apenas R$ 15/MWh.

Ao invés de capturarmos um diferencial desses R$ 15 para ajudar a pagar quando o valor atinge R$ 800, nada fazemos.

O que isso tem a ver com a notícia? Tudo, pois só entendendo que os custos em tempos distintos podem se compensar é que é possível aproximar o custo marginal do custo médio, que é o que está sendo proposto.


Por Rodrigo Polito e Stella Fontes | Do Rio e de São Paulo

Mesmo em cenário de baixo nível dos reservatórios hidrelétricos e de regime de chuvas incerto para o próximo verão, o preço spot (de curto prazo) de energia pode cair cerca de 50% em 2015, segundo projeções de empresas e especialistas do setor.

A queda pode ter um efeito, quase que na mesma proporção, sobre os bilionários custos extras arcados por consumidores, empresas e Tesouro, com a geração contínua de térmicas para garantir o suprimento de energia ao país.

A explicação está na mudança da metodologia de definição do valor máximo do preço spot de energia, em discussão hoje na Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Análise feita pelo Valor com base nas 30 contribuições sobre o assunto enviadas por agentes à autarquia mostra que parte significativa deles sugere a redução do valor máximo do preço spot, dos atuais R$ 822 por megawatt-hora (MWh), para cerca de R$ 400.

Simulação feita pela Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee), com base no primeiro semestre de 2014, indica que, se o preço spot fosse mantido no teto regulatório, de R$ 822/MWh, ao longo de todo o período, o custo total para os consumidores seria entre R$ 26 bilhões e R$ 28 bilhões. Considerando um preço teto de R$ 400/MWh, esse custo seria cerca de 30% menor, o equivalente a R$ 18,5 bilhões.

A discussão envolve um emaranhado de questões técnicas existentes na regulação atual. Na prática, o limite máximo do preço de liquidação de diferenças (PLD, que baliza o preço spot de energia) considera o valor que remunera a térmica de porte significativo com o maior preço declarado entre as usinas do sistema brasileiro. Na época da definição da regra, no início dos anos 2000, foi escolhida como referência a térmica de Camaçari, da Chesf, de 350 megawatts (MW) de capacidade e preço de R$ 319,00/MWh. O valor escolhido então foi de R$ 350/MWh, atualizado anualmente pelo IGP-M.

Como o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) aciona as térmicas pela ordem da mais barata até a mais cara, na prática, sempre que a usina de Camaçari é acionada, o PLD alcança o preço-teto.

A maioria das contribuições enviadas à Aneel defende que a térmica de Camaçari não é representativa dentro do parque termelétrico atual. O grupo CPFL, por exemplo, propõe, como referência, a utilização da térmica Macaé, da Petrobras. Com disponibilidade de 900 MW médios, é uma das térmicas a gás com maior custo – atualmente R$ 388,04/MWh. “Ao ser despachada por mérito, a UTE Macaé integraliza o despacho de 70% do parque térmico”, diz a CPFL, no documento enviado à agência.

De forma geral, muitos participantes da consulta pública da Aneel indicaram valores entre R$ 350/MWh e R$ 500/MWh para o valor teto do preço spot. Alguns deles sugeriram um valor baseado no custo médio de operação das principais térmicas do país.

O custo médio faz parte da proposta da AES Brasil. “O PLD elevado pode gerar uma pressão financeira para as distribuidoras, clientes livres e geradores, podendo tornar o negócio insustentável e levar determinadas empresas à falência. Com um PLD máximo menor, em torno de R$ 400/MWh, por exemplo, um cenário de estresse parece mais provável e factível, e isso pode induzir investidores e agentes a simularem e se prepararem para um evento dessa proporção”, defende a elétrica, em documento.

O tema, porém, está longe de ser um consenso. Há no mercado quem defenda a manutenção da metodologia atual, ou que a mudança das regras entre em vigor apenas a partir de 2016. Isso porque alguns agentes, como geradores, já definiram sua estratégia de venda de energia para o próximo ano com base na regra atual.

Para o diretor da consultoria PSR, Mario Veiga, a Aneel vive uma “escolha de Sofia”. Segundo ele, é importante fazer uma adequação dos preços, porém, a medida pode gerar instabilidade regulatória. “A pior situação é ter que fazer mudanças em cima da hora. O ideal, em qualquer lugar, é fazer mudanças com anos de antecedência. Mas é uma situação complicada. Defendo que seja feita uma redução [do preço teto], mas que seja feita de forma muito transparente”, disse ele.

Veiga é favorável à metodologia atual. Ele, porém, defende a revisão do teto regulatório. “No mundo inteiro, o preço do curto prazo é o preço do equipamento mais caro. O que existe em diferentes lugares do mundo é o limite desse preço.”

O coordenador do Grupo de Estudos do Setor Elétrico (Gesel), da UFRJ, professor Nivalde de Castro, também defende a mudança da definição do valor máximo do preço spot. “O Gesel fica admirado como um indicador tão importante para o setor elétrico tem como referência uma térmica que já mudou de estrutura de combustível e cujo valor, lá dos anos 2000, vem sido corrigido pelo IGP-M. Ele [o valor] não expressa nada do ponto de vista econômico”, afirmou Castro.

 

 

 

 

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