Geração distribuída, regulação e tarifas – Artigo no Valor

https://www.valor.com.br/opiniao/6030991/geracao-distribuida-regulacao-e-tarifas

Análise do ILUMINA:

  1. Sobre a celeuma do aquecimento global, o ILUMINA não tem nenhum especialista. Mas, sugerimos fazer uma conta. Considerada a camada denominada troposfera, o volume desse gás é equivalente a 0,18% do volume da terra. Se considerarmos a estratosfera, onde já é impossível encontrar formas de vida, a relação é 0,7%. Portanto, a hipótese de que tudo o que retiramos da terra e jogamos nesse gás possa causar algum efeito negativo não parece ser desprezível.
  2. Os leilões de energia de reserva, uma espécie de “oferta de garantia por fora” são realmente um custo extra que afeta o consumidor. Mas isso não é resultante da geração distribuída e sim das adaptações (leia-se jeitinhos) necessárias para encaixar esse modelo competitivo vigente no singular sistema brasileiro.
  3. Temos um sistema que captura energia cinética, gera corrente elétrica, transmite e entrega nas tomadas. No mundo de hoje, prevalece um visão fragmentada desse setor elétrico que acaba gerando visões parciais do problema. A geração distribuída não causa apenas problemas para as distribuidoras. Senão vejamos:
    1. O máximo de consumo tem ocorrido no período de 15 hs até 16hs. Portanto, nesse intervalo, as fotovoltaicas estão reduzindo o pico de consumo.
    2. Redução de corrente no momento de pico reduz perdas elétricas, que, ao contrário do que alegam as distribuidoras não se limitam ao roubo de energia. Vide a bagunça dos postes.
    3. Se as bandeiras tarifárias são um sinal econômico para o consumidor tentar reduzir o consumo e ajudar a gestão dos reservatórios, a geração fotovoltaica faz isso o ano todo. Como os reservatórios estão vazios, só há benefício e são para todos!
  4. Sobre a troca de kWh das fotovoltaicas e o sistema, só há um argumento que justifique uma desvalorização da geração fotovoltaica excedente. Esse seria o fato de que o kWh que volta para o sistema é guardado em volume de água em algum reservatório e essa água pode evaporar com o calor. Só que esse argumento, sistêmico, não foi usado pelo autor.
  5. O problema que ainda permanece não resolvido é o da contratação de longo prazo. As distribuidoras, enquanto não forem responsáveis apenas pelo fio da sua rede, irão continuar sendo as únicas contratantes de longo prazo? O mercado livre, que pretende ser ampliado, até agora não mostrou esse apetite por contratos longos. Vai mudar? Como? A Eletrobrás perdeu sua capacidade de investimento em função do desastre da MP 579. Como ficamos sem ela?
  6. É verdade que alguns problemas elétricos vão se ampliar. Maior reserva girante, menor inércia para controle de frequência e outros. Portanto, o que precisamos definir é a política de ambos os efeitos: aumento e redução de custos. O artigo parece apontar apenas o aumento.

Por Geoberto Espírito Santo

Gerar energia com fontes renováveis é uma tendência mundial para a alavancagem de um novo período de crescimento, originada pelo fim da Guerra Fria e pela necessidade de ocupação do vácuo tecnológico deixado pelo freio na corrida espacial e na ampliação dos arsenais nucleares. O desenvolvimento de fontes renováveis é uma das estratégias da tese do aquecimento global tendo a geopolítica como pano de fundo, porque para usar o sol e o vento não precisa ir além fronteiras. Um grupo menor de cientistas é cético sobre as causas desse aquecimento, mas todos concordam com a política ambiental que para alguns já é uma ideologia.

A Agência Internacional de Energias Renováveis (Irena) mostra que em 2017, no mundo, foram instalados 100 GW da fonte solar fotovoltaica, 40% maior que em 2016 e 100% sobre 2015. No Brasil, depois da Carta dos Ventos/2009, a fonte eólica teve uma maior penetração no Sistema Interligado Nacional (SIN) com os leilões por disponibilidade para o Ambiente de Contratação Regulado (ACR), apoiada nos compromissos do governo com a estratégia mundial. Leilões de Energia de Reserva (LER) também tiveram o seu papel nesse sucesso, os custos dessa fonte caíram com projetos de melhor rendimento e já se discute a possibilidade de contratos por capacidade e produção endereçada ao Mercado Livre.

No Brasil, GD parece ser apenas a fonte solar fotovoltaica, por representar 83% das fontes distribuídas, mas é qualquer produção de energia diretamente conectada à rede de distribuição. Mas também podem ser utilizadas as fontes eólica, biomassa, PCHs, CGHs, gás natural, geotérmica, baterias e células de combustível de hidrogênio livre de carbono, devendo ser implantadas não só pelo critério do impacto ambiental, mas também por propriedade, operação e quantidade de penetração.

A GD solar teve um grande impulso com as RN Aneel 482/2012 e 687/2015, tornando-se competitiva pela redução em 75% dos seus preços na última década e com o forte aumento nas tarifas das distribuidoras. O regulador adotou o sistema de compensação (net metering) já utilizado na Austrália, Bélgica, Canadá, Chile, Dinamarca, Itália, Holanda, Coreia do Sul, Cingapura e parte dos EUA. Ultrapassamos 350 MW de potência instalada, atendendo a 44 mil unidades nas residências, comércio, indústria, produtores rurais e prédios públicos, com R$ 2,5 bi investidos.

Tecnicamente, uma penetração de 20% das micro e mini GD no sistema atual é considerada segura, mas o sucesso veio antes do que se esperava e começa a causar distorções tarifárias. Na compensação atual, troca-se o kWh fotovoltaico (custo da energia gerada) com o kWh entregue pela concessionária (custo da energia comprada + transmissão + distribuição + encargos setoriais). Pela falta de total aderência entre a geração fotovoltaica (durante o dia) e a curva de carga diária do consumo desses “prosumidores” (no restante do tempo), eles continuam dependentes da concessionária. Com a difusão dessa postura as distribuidoras perderão receita, mas continuarão com as mesmas responsabilidades operacionais e com os custos de disponibilidade de transmissão e distribuição, que vão ser rateados pelos clientes cativos da concessionária, um subsídio cruzado calculado de 1,5% ao ano dos mais pobres para os mais ricos

Os encargos setoriais já pesam 20% na composição tarifária e nele temos a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), também composta por custos oriundos de subsídios para solar e eólica na redução da TUST, da TUSD e pagamento da Energia de Reserva que são repassados para todos os consumidores. Aliás, é complicado entender porque temos que pagar “reserva” quando compramos “garantia física” nos leilões. A inserção de renováveis intermitentes num mercado já consolidado, como o da União Europeia, é muito diferente do que colocá-las num mercado em expansão, como no Brasil. Lá, uma substituição, com os investimentos na geração de base e na transmissão já remunerados. Aqui, uma expansão, vamos ter que adicionalmente remunerar esses dois segmentos para que possamos assegurar energia nas 24 horas do dia.

Nosso modelo de expansão foi concebido para planejamento, leilões e contratos de longo prazo e já temos 165 GW de potência instalada para remunerar com um mercado de 68 MW médios de demanda. No mercado cativo das distribuidoras nossa tarifa é uma das maiores do mundo, na qual pesam repasses criados por legislação federal, tributação estadual e contribuição municipal. Esse nível cada vez mais alto estimula uma maior adesão dos “prosumidores” e essa “espiral da morte” promove uma perversa transferência de custos para os “sem painel”, justamente aqueles que não dispõem de recursos para produzir sua própria energia.

O marketing da “energia limpa” é pesado e o racional seria dizer que as fontes eólica e solar são energias “menos sujas”, pois são limpas apenas na sua operação. Se considerarmos o ciclo completo da conservação de energia (retirada da matéria-prima da natureza, transporte, produção industrial, instalação, operação, manutenção, descarte) as fontes nuclear e hidráulica produzem menos kg de CO2 equivalente/kWh. Esses números, e suas projeções, seriam bem menores se tivéssemos investido na produtividade elétrica, fazendo mais com menos, implantando um consistente programa de eficiência energética em nossas instalações.

A Aneel está preocupada com a escalada das tarifas e um ajuste na regulação da GD já estava previsto até 2019, quando em Audiência Pública recebeu mais de 80 contribuições. A remuneração do uso da rede é justa, mas é preciso medir quanto ela está sendo usada em termos de posto horário e de distância entre o ponto de injeção e de consumo. Exige a estimação adequada dos custos e benefícios sistêmicos, realidade distante por causa da insuficiência de estudos conclusivos sobre o fator de coincidência entre as curvas de carga do sistema e de geração.

O sistema de compensação gera muito excesso com uma GD que produz por 24h/dia. Tarifas horárias e locacionais bem desenhadas são capazes de gerar incentivos e sinais de preço mais eficientes para os consumidores. Uma tarifa prêmio que permita a venda de excedentes ou uma tarifa de compra e outra de venda são soluções que chegarão com a abertura do mercado.

Certamente que, para avaliar motivos e temporalidade dos subsídios, a Aneel vai também levar em conta os benefícios da GD: redução na perda das potências real e reativa e na oscilação do sistema; aumento da estabilidade, confiabilidade, capacidades de carregamento e de transferência de energia disponível.

Geoberto Espírito Santo é engenheiro e professor aposentado do Centro de Tecnologia da Universidade Federal de Alagoas (UFAL).

 

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