Modelos de organização do setor de petróleo – ARTIGO

Paulo Metri – mestre em Engenharia Industrial e conselheiro do Clube de Engenharia.

 

Um modelo de organização do setor de petróleo, para ser adotado por um país, deve conter o máximo de impactos sociais positivos e o mínimo de negativos. Alternativas de modelo não devem ser analisadas olhando-se só um aspecto, como é o caso frequente do uso do aumento da atividade econômica, resultante dos modelos, para que a decisão seja tomada. Pois, a melhor opção pode ser lucrativa para as empresas e não acarretar grande benefício social.

Os critérios de avaliação dos modelos, para apoiar o processo de escolha, são sugeridos a seguir. O modelo deve: (1) priorizar a posse pelo Estado brasileiro do máximo de petróleo produzido, visando à realização de ações estratégicas; (2) maximizar a arrecadação de tributos para permitir ao Estado suportar programas sociais; (3) minimizar o preço de venda dos derivados de maior consumo pela classe pobre; (4) gerar o máximo de compras e empregos no país, com ênfase na fase de implantação dos empreendimentos; (5) contratar ao máximo no Brasil os serviços de desenvolvimento tecnológico e de engenharia; (6) minimizar a possibilidade de acidentes em unidades operacionais e de transporte e os impactos ao meio ambiente.

O primeiro modelo do setor do petróleo a ser considerado é o do monopólio estatal, que maximiza os benefícios sociais em um país em desenvolvimento, desde que haja controle social sobre a estatal executora do monopólio, para evitar o seu uso político e corporativo. A afirmação que “o monopólio é prejudicial à sociedade, porque a empresa monopolista fixa livremente o preço de venda dos seus produtos” só é verdade para um monopólio privado. Um monopólio estatal controlado pela sociedade não a extorque.

O monopólio estatal pode ser usado como instrumento eficaz para a consecução de políticas públicas, o que é impossível através de empresas privadas. Por exemplo, a Petrobras foi explorar petróleo na bacia de Campos, nos anos 1970, quando o barril custava só US$12, para reduzir a dependência do Brasil ao petróleo importado, que chegava a 85%. Desenvolveu fornecedores nacionais para evitar compras no exterior. Priorizou desenvolver tecnologia no país, o que já lhe rendeu três premiações da Offshore Technology Conference e muita economia de divisas. Se o monopólio não tivesse sido criado, o Brasil seria, desde 1953, o paraíso das empresas estrangeiras. Aí, o Pré-Sal ainda não teria sido descoberto, pois o petróleo não está escasso a ponto de elas irem buscá-lo a 7.000 metros de profundidade, tendo que transpor uma camada de sal de 2.000 metros. Só uma petrolífera do Estado, que tem como lógica o benefício da sociedade, realiza este feito.

Por interferência do capital internacional, através de políticos entreguistas, o monopólio foi extinto em 1995. Havendo a imposição de empresas privadas participarem da exploração e produção de petróleo, existem no mundo três modelos de contratação delas: a concessão, o contrato de partilha da produção e o de prestação de serviço. Como não existe, no Brasil, petrolífera privada nacional que consiga competir com a Petrobras e as estrangeiras em águas profundas, a contratação aqui é destas duas, consorciadas ou não.

Nas concessões, a empresa petrolífera fica com a posse total do petróleo descoberto e paga tributos. Se não descobrir petróleo, os investimentos realizados não são ressarcidos pelo Estado. Nos contratos de partilha da produção, a empresa petrolífera, descobrindo petróleo, terá posse só da sua parcela da produção, constante do acordo de partilha. O restante do petróleo ficará com o Estado. A empresa poderá ainda pagar tributos sobre a sua parcela. Se não descobrir petróleo, os investimentos realizados pelo contratado não são ressarcidos pelo Estado. Nos contratos de prestação de serviços, a empresa petrolífera não terá posse do petróleo descoberto e será remunerada pelos serviços prestados de prospecç&atild e;o, perfuração, produção e outros. Se não for descoberto petróleo, será remunerada da mesma forma pelo Estado.

A concessão tende a beneficiar mais as petrolíferas em detrimento do Estado, enquanto, no contrato de partilha, o maior beneficiário tende a ser o Estado. Supondo que este irá repassar o acréscimo de benefícios para a sociedade, então o contrato de partilha é melhor para ela. Muitos porta-vozes de grupos estrangeiros dizem, buscando confundir a população, que os contratos de concessão são mais comuns entre os países desenvolvidos e os contratos de partilha da produção são adotados com mais frequência por países em desenvolvimento. Este fato realmente ocorre, mas a intenção ao divulgá-lo é dizer que a concessão é melhor que o contrato de partilha.

A maioria dos países desenvolvidos não tem reservas, como é o caso da Alemanha, Japão, França, Itália e Coréia do Sul. As exceções são Canadá, Estados Unidos, Noruega e Reino Unido, que têm reservas e adotam o modelo da concessão, porque a maioria das petrolíferas de porte, muitos fornecedores e centros de desenvolvimento tecnológico do setor petrolífero têm sede nestes países. Os Estados Unidos proíbem a exportação do seu petróleo, não permitindo que empresas, visando uma maior lucratividade no curto prazo, contribuam para um desabastecimento futuro. Isto não ocorre no Brasil, pois, quando só existiam reservas garantidas para 17 anos, empresas estrangeiras exportavam suas produções do Brasil.

A Noruega e o Reino Unido adotam as concessões, mas tomam medidas de repercussão social. A Noruega destina as áreas com grande expectativa da existência de petróleo para a estatal Statoil, restando áreas menos nobres para as petrolíferas estrangeiras e, mesmo assim, com a imposição eventual de participação da Statoil. No Brasil, só recentemente, o artigo 12 da lei do contrato de partilha foi usado, permitindo a entrega direta de áreas para a Petrobras, para tristeza do capital internacional, que queria vê-las leiloadas.

No Reino Unido, quando a exploração do Mar do Norte começava, foi criado o órgão governamental Offshore Supplies Office, que determinava aos concessionários onde, neste Reino, alguns equipamentos deveriam ser comprados. Uma atitude análoga no Brasil seria considerada cerceamento da liberdade empresarial. A política brasileira de conteúdo local é baseada na indução para a compra no país e não veta a compra no exterior. Ainda assim, é combatida pela mídia, que representa o capital internacional, visando maximizar seus lucros e pouco se importando com o país que quer aproveitar a existência das reservas para alavancar seu desenvolvimento.

Olhando as escolhas pela concessão ou o contrato de partilha, já feitas pelos países em desenvolvimento, a regra que pode ser deduzida é que aqueles com maior grau de soberania escolhem os contratos de partilha e os com baixo grau se subordinam às concessões. A argumentação de que em áreas de maior risco, as empresas estrangeiras só se motivam a participar se tiverem concessões, é compreensível. Mas isto não significa que elas não venham a fechar contratos de partilha. Com dados de 2004, África do Sul, Argentina e Peru tinham só concessões. Angola, Bolívia e Egito tinham só contratos de partilha. Argélia, Colômbia, Nigéria e Rússia tinham concessões e contratos de partilha. Países podem ter concessões da época de administraç&ot ilde;es neoliberais e contratos de partilha de períodos com administrações soberanas, que deve ser o caso da Rússia.

Os contratos de serviço podem ser prestados para o Estado diretamente ou para estatais do setor. Neste caso, tem-se grande controle do Estado sobre o setor. As petrolíferas estrangeiras não gostam de ser assim contratadas porque isso restringe seus ganhos e não há o recebimento de parcela alguma do óleo produzido. O Irã só usa este tipo de contrato. O México o usava, mas, como o monopólio estatal foi derrubado recentemente, a concessão está sendo usada. A Venezuela tem contratos de partilha e de serviços. Países do Oriente Médio, ainda nos anos 70, nacionalizaram seus setores petrolíferos. A Líbia e o Iraque invadidos têm seus setores de petróleo tutelados, o que representa a opção de desorganização do setor.

O abastecimento do Brasil, graças ao Pré-Sal, está garantido por muitos anos. A produção atual da Petrobras satisfaz a demanda nacional. Contudo, pode-se aumentar a produção do Pré-Sal, acima do acréscimo de demanda, para permitir ao Brasil exportar e acumular divisas. Mas, para a exportação ocorrer com o máximo usufruto da nossa sociedade, a empresa exportadora precisa ser a Petrobras. Os entreguistas argumentam que ela não tem capacidade financeira para explorar sozinha a região, o que é verdade para os níveis de produção que eles não explicitam. Ao nível de produção de máxima satisfação da sociedade, a Petrobras tem capacidade.

Sendo politicamente difícil revogar a lei dos contratos de partilha, o capital internacional busca derrubar pontos positivos desta lei, como a obrigatoriedade de a Petrobras ser a operadora única do Pré- -Sal, dela ter 30% em todos os consórcios desta área e as exigências de conteúdo nacional. A operadora em qualquer consórcio é a responsável pelas compras do consórcio e, sendo a Petrobras, sabe-se que as compras no Brasil serão maximizadas. E não existe operadora de consórcio que detenha menos de 30% de participação.

A lei das concessões tem embutida a pressa de interesse das empresas estrangeiras. A ANP não busca baixar a frequência dos leilões, cuja necessidade não é explicada para a sociedade. Enfim, existe muito entulho neoliberal no setor. Um ponto é crucial: não podem mais existir leilões de áreas na região do Pré-Sal, que a Petrobras descobriu e conhece bem. Estas áreas devem ser entregues a ela diretamente, seguindo o artigo 12 da lei da partilha, adequando a necessidade de investimentos ao fluxo de caixa da empresa.

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