Produção de energia solar em casa traz polêmica para o país – Folha de SP

Análise do ILUMINA:  Esse é o típico exemplo de que, enquanto o país fica distraído com a polarização “fake” ou “fato”, análises parciais jogam a verdade no lixo.

Enquanto o mundo percebe que grande parte da energia solar pode ser transformada em eletricidade com significativos benefícios para o consumidor e para o planeta, o Brasil já começa a deixar tudo indefinido e ao sabor de interesses empresariais.

A falta de política pública é um grande vexame. Não só porque ocupamos um pedaço do planeta bastante ensolarado, como temos singularidades que fazem as fotovoltaicas provocarem benefícios para além do dono do telhado.

As curvas abaixo mostram a evolução do consumo total de energia elétrica em vários dias de semana de todos os meses de 2016 (Dados do ONS). Nós já tínhamos mostrado outras incoerências antes em

http://www.ilumina.org.br/a-tarifa-branca-e-a-curva-de-carga-analise/

ao comentar que, ao contrário do que as pessoas pensam, o pico de consumo do sistema está ocorrendo às 15 hs e não mais às 20hs.

Mas, aqui, o foco é outro. Imaginem que uma parte significativa de telhados sejam cobertos com fotovoltaicas. Além de “refrescarem” os quentes tetos, para o sistema, é como se a consumo passasse a se comportar seguindo a linha azul ao invés da vermelha durante a exposição solar (figura abaixo).

Portanto, a área azul corresponde a uma quantidade de energia economizada do sistema de geração.

No caso brasileiro, essa energia não fornecida pelo conjunto de usinas pode gerar duas consequências, que podem ocorrer separadamente ou em conjunto:

  1. O sistema de reservatórios economiza água.
  2. As usinas térmicas geram menos energia.

Só quem não entende o sistema brasileiro é que não percebe que esse é um benefício sistêmico, ou seja, dividido com todos os consumidores. Isso quer dizer que um consumidor com fotovoltaicas no atual cenário brasileiro alivia custos para outros consumidores que não têm telhado!

A celeuma descrita abaixo chega a ser totalmente incoerente com outras políticas setoriais, como, por exemplo, as bandeiras tarifárias. Se elas foram criadas como um sinal econômico para os consumidores economizar energia, como um telhado que economiza energia do sistema pode causar algum malefício?

Só há benefícios? Claro que não! Dada a pasmaceira das autoridades brasileiras e a crença quase religiosa que o “mercado” tudo resolve, não conseguiram entender o seguinte problema:

  1. Se o Brasil voltar a crescer, vamos precisar de pelo menos novos 2.000 MW médios/ano. São apenas 4 usinas de Furnas, ou 1/4 de Itaipu a cada ano.
  2. Quem vai contratar usinas no longo prazo? Como se sabe, não existe investidor que construa uma usina sem ter certeza que vai vender sua energia.
  3. Quem contrata no longo prazo no Brasil hoje? As distribuidoras. O histórico do mercado livre não registra contratos de longo prazo. Com tantas incertezas, alguém acha que elas vão garantir a expansão da oferta?
  4. Portanto, além de perderem vendas para os “com telhado”, assumem um papel que não podem assumir.
  5. Os “custos” extras argumentados pelas distribuidoras não se referem ao sistema de distribuição, que, na realidade poderá até ter um alívio.
  6. O custo extra está “solto” sem dono. Tudo porque o Brasil acredita ter uma maldição não poder ter um ente estatal sério que faça esse papel. Tem muitas estatais inúteis e não pode ter uma essencial porque o “estado” é confundido com o governo e esse não tem jeito.

Imaginem a contradição. O modelo mercantil em vigor exigiu as seguintes entidades: ONS (operação), CCEE (comercialização), EPE (planejamento) e ANEEL (regulação). São organizações de grande porte que enxergam o problema de modo fragmentado. Chega a ser ridículo que um sistema que já têm tantas tecnocracias não consiga definir uma responsabilidade tão essencial para qualquer uma delas. Sobre esse assunto, nenhuma palavra na reportagem.

Quando se faz uma matéria sem aprofundamento, fica parecendo que os que instalam fotovoltaicas não pagam o uso da distribuição. Falso!

Quando se faz uma matéria sem aprofundamento, fica parecendo que os que instalam fotovoltaicas não pagam consumos mínimos. Falso! A Light, por exemplo, vai cobrar 100 kWh mesmo que não tenha consumido.

Quando se faz uma matéria sem aprofundamento, fica parecendo que a instalação do sistema é fácil e livre de uma burocracia da distribuidora. Falso! Instalações do novo medidor chagam a demorar 4 meses!

Roberto Pereira D’Araujo


Distribuidoras e indústria de equipamentos travam briga pelos subsídios

Taís Hirata

SÃO PAULO

Países em todo o mundo têm criado incentivos para que os consumidores gerem sua própria energia em casa, em geral por meio de painéis solares. O crescimento desse sistema, porém, criou uma briga global, em que as distribuidoras de energia tentam derrubar benefícios oferecidos aos consumidores para instalar os equipamentos nas residências.

Essa briga chegou ao Brasil.

Há uma discussão em curso na Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) para que, até 2020, esses geradores domésticos passem a pagar tarifas mais altas.

Tal como nas outras partes do mundo, a questão é alvo de uma batalha ferrenha entre as distribuidoras de energia e a indústria de fontes renováveis, principalmente a solar.

De um lado, as distribuidoras defendem o fim dos subsídios para geradores domésticos, alegando que os demais consumidores de energia estão arcando com seus custos.

Já os defensores da modalidade afirmam que, além dos benefícios ambientais, a geração de energia no próprio local de consumo também produz economias à conta de luz, devido à redução de novos investimentos em linhas de transmissão.

O sistema —chamado de geração distribuída— aumentou de forma acelerada no Brasil, principalmente a partir de 2015, quando a Aneel definiu que os consumidores capazes de gerarem energia em casa passariam a obter descontos na conta de luz.

A medida tornou economicamente vantajoso instalar os geradores, pois o investimento inicial feito para comprar os equipamentos é compensado ao longo dos anos.

Funciona assim: se uma casa consome 300 kWh no mês e instala painéis solares no telhado que geram 200 kWh, a residência só pagará pelos 100 kWh que não gerou.

A mudança alavancou o sistema. Em 2015, eram 1.823 unidades geradoras, com potência de 17 mil kW. De lá para cá, o parque cresceu quase 20 vezes. Em julho eram 33,3 mil geradores, com 403 mil kW.

A energia solar fotovoltaica representa cerca de 77% do total, segundo levantamento. A proposta das distribuidoras, que está em discussão na Aneel, é limitar a economia desses geradores.

O desconto hoje é feito sobre toda a conta de luz, que tem diversos componentes: taxa para pagar a energia gerada em si, para compensar gastos das distribuidoras com suas redes, para remunerar investimentos em transmissão, pagar encargos sociais.

As distribuidoras querem que o desconto dos geradores possa ser feito apenas sobre a tarifa da energia, e não sobre as demais taxas —incluindo a da própria distribuidora. Na prática, essa proposta reduziria a economia da geração doméstica em até 62%.

Para Nelson Leite, presidente da Abradee (associação que representa as distribuidoras), o crescimento acelerado da geração distribuída e a queda dos preços de energias renováveis (que reduz o investimento inicial) atestam que subsídios não são necessários.

“Já deu. As fontes conseguem caminhar com as próprias pernas. É uma questão de justiça tarifária, pois eles não pagam pelo uso da rede, e os demais pagam sem saber. Quem não tem condição de instalar esses sistemas são justamente os mais pobres.”

Esse subsídio de fato é transferido para a conta dos demais consumidores, mas, em um primeiro momento, quem arca com os descontos é a própria distribuidora —daí a resistência das companhias ao modelo, segundo Claudio Sales, presidente do Instituto Acende Brasil.

O problema é que esses repasses referentes aos subsídios demoram a ocorrer: só podem ser feitos nas revisões tarifárias, que ocorrem, em média, de quatro em quatro anos.

Há também uma preocupação das distribuidoras em relação ao crescimento acelerado desse mercado.

O potencial é enorme: em um cenário extremo, a geração de energia solar em telhados das residências em todo o país poderia chegar a 286 GWh por ano.

Isso equivale a praticamente metade da geração anual do Brasil, segundo dados de 2016 da EPE (órgão público responsável por estudos do setor elétrico).

“É claro que [esse cenário] seria inviável, mas mostra que há um potencial enorme. Hoje, porém, eles [geradores domésticos] representam uma parcela irrisória, nem 1%”, afirma Rodrigo Sauaia, presidente da Absolar (associação da indústria solar fotovoltaica).

Para ele, um aumento das tarifas desestimularia o mercado, pois torna mais longo o período que o investimento inicial demora para se pagar.

Sauaia também critica as distribuidoras e diz que elas só estão pensando em sua própria saúde financeira. “A discussão não pode ficar centrada na manutenção do lucro de um grupo pequeno de empresas”, diz.

Para Guilherme Susteras, sócio da Sun Mobi, empresa do setor, o aumento das tarifas provocaria o congelamento do mercado por dois anos, período no qual dificilmente empresas de pequeno e médio porte (como a dele) sobreviveriam.

“As distribuidoras fazem pressão para evitar uma transição a um novo mercado que é irreversível”, diz ele.

Já as distribuidoras afirmam que não querem travar o mercado nem o avanço de fontes limpas, apenas acabar com os subsídios. “Isso não vai quebrar as pequenas empresas, vai apenas diminuir sua rentabilidade. Esse é um discurso apocalíptico do setor solar fotovoltaico”, afirma Nelson Leite, da Abradee.

Para Claudio Sales, os subsídios foram importantes para alavancar o mercado em um primeiro momento, mas eles são insustentáveis. “Já está mais do que na hora de rever essa regulação.”

A área técnica da Aneel propôs um modelo de transição, em que, por exemplo, se mantivesse o cenário atual por alguns anos e os benefícios fossem reduzidos com o tempo.

A proposta, porém, foi apenas um pontapé para a série de consultas e audiências públicas que serão realizadas nos próximos meses. Qualquer mudança entrará em vigor apenas a partir de 2020.

A primeira consulta pública sobre o tema foi encerrada em junho. Neste segundo semestre, a previsão é que a Aneel elabore um novo estudo de impacto e abra uma rodada de discussões. O debate definitivo só será concluído no fim de 2019.

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