A privatização da Eletrobras seria extremamente prejudicial ao país

Joaquim Francisco de Carvalho

 

A quase completa privatização do sistema elétrico feita no governo FHC (1995-2002) foi um fiasco. O novos donos das antigas estatais pouco investiram para expandir o sistema, obrigando o governo a fazê-lo. E, em vez de mais baratas, as tarifas para o setor residencial subiram mais de 69%, e as do setor industrial aumentaram cerca de 158% acima da inflação, provocando a falência de inúmeros estabelecimentos industriais e desempregando centenas de engenheiros e milhares de operários qualificados.

Sobrou a Eletrobras, que agora o ministro Paulo Guedes (Economia) pretende privatizar, sem apresentar um motivo plausível para isso.

A Eletrobras é muito rentável, tendo apresentado um lucro líquido de R$ 10,7 bilhões no exercício de 2019 – resultado que ainda pode melhorar, desde que a holding e suas subsidiárias (Furnas, Chesf, Eletronorte e metade de Itaipu) afastem-se das influências “políticas” e sejam submetidas a diretores competentes e honestos.

Lembro aqui a diferença que existe entre o espaço privado e o público. O espaço privado é ocupado por empresas industriais, financeiras, comerciais e outras, que têm entre os seus objetivos o de gerar lucros. No espaço público ficam atividades não lucrativas, como a diplomacia, a segurança nacional, o ensino e a pesquisa, a saúde pública etc., além de certas “utilities”, vitais para as demais atividades e que sejam monopólios naturais.

Ocorre que a energia elétrica é um monopólio natural, do qual dependem a indústria, as comunicações, o comércio, os serviços, ou seja, praticamente tudo. Assim, as tarifas elétricas não devem ser formadas no espaço privado, pois influenciam todos os custos da economia e constituem um privilegiado instrumento de arrecadação de parte da renda dos demais setores.

Cerca de 70% da eletricidade consumida no Brasil vêm de usinas hidrelétricas, quase todas da Eletrobras – e a geração de energia é apenas um dos usos dos reservatórios, ao lado de outros, como o abastecimento de água, a irrigação etc. O controle dos grandes reservatórios hidrelétricos é estratégico. Por essa razão, até nos EUA estes são públicos.

Devido ao falhanço do modelo concebido com o objetivo (inatingível) de converter em mercadoria um monopólio natural como a energia elétrica, a Eletrobras vinha sofrendo grandes prejuízos por ter sido obrigada a arcar com os prejuízos modelo, para alimentar lucros astronômicos a intermediários não produtivos.

As hidrelétricas ainda pertencentes ao grupo Eletrobras têm idades em torno de 30 anos; portanto o capital nelas investido está amortizado. Assim, a energia gerada custa atualmente cerca de R$ 39/MWh.

O grupo Eletrobras responde por uma oferta da ordem de 170 milhões de MWh por ano. Essa energia poderia ser repassada diretamente às distribuidoras por uma tarifa média de R$ 160/MWh. Portanto, considerando o custo de R$ 39/MWh, o grupo pode lucrar R$ 20,4 bilhões por ano, podendo autofinanciar a sua expansão e modernização.

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Joaquim Francisco de Carvalho

Mestre em engenharia nuclear e doutor em energia pela USP, foi engenheiro da Cesp, diretor industrial da Nuclen (atual Eletronuclear) e pesquisador associado ao IEE/USP (Instituto de Energia e Ambiente)

 

 

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