Carta ao Rodrigo Maia dos Conselheiros eleitos pelos empregados da Eletrobras

Carta dos Conselheiros de Administração Eleitos pelos Empregados das Empresas do Grupo Eletrobras ao Presidente da Câmara dos Deputados

Excelentíssimo Senhor Presidente Rodrigo Maia,

Nós, membros do Conselho de Administração de Eletrobras, Furnas, Chesf, Eletronorte, Eletrosul, CGTEE, Amazonas GT, Cepel e Eletronuclear, vimos por meio desta carta ressaltar informações relacionadas ao Sistema Eletrobras e ao Setor Elétrico, visando subsidiar a discussão sobre a modelagem de possível privatização.

  1. Como registrado em declarações ao longo da campanha presidencial de 2018, o Presidente da República pontuou a importância estratégica da Eletrobras, se referindo especialmente à soberania e segurança nacional.
  2. Nos causa preocupação a desinformação e a utilização de argumentos e bravatas que não contribuem para o debate sadio. A Eletrobras é uma Companhia lucrativa, estratégica, propulsora da expansão do setor elétrico e promotora de políticas socioambientais. Apresentamos a seguir dados técnicos.
  3. A Eletrobras vem se reestruturando profundamente após a entrada em vigor da MP579/2012 que reduziu de forma significativa suas receitas. Com a redução repentina nas tarifas de geração e pela obrigação institucional da operar as distribuidoras deficitárias, a Eletrobras registrou prejuízo de 2012 até 2015 porém subsidiando, assim, a conta de luz de milhões de consumidores residenciais e comerciais brasileiros.
  4. Nesse período, apenas uma única vez foi realizado aporte pelo Tesouro, via aumento de capital, Adiantamento para Futuro Aumento de Capital (AFAC), no montante de R$ 2.9 bilhões. Cabe ressaltar que no mesmo período, estatais como Valec, Infraero, Codevasf, receberam aportes maiores e recorrentes.
  5. Os AFACs são recursos que aumentam o capital da companhia, mas ainda que os interprete como dispêndio do Tesouro para cobrir déficits, vale ressaltar que nos últimos 10 anos, a Eletrobras entregou à União mais de R$ 15 bilhões de reais por meio de seus dividendos, que puderam ser investidos em saúde e educação.
  6. Valor esse de R$ 15 bilhões que é superior aos R$ 12 bilhões estimados que se pretende arrecadar via privatização nas modelagens da Capitalização proposta pelo Ex-Presidente Temer.
  7. Nessa esteira, é importante pontuar que o Tribunal de Contas da União questiona os valores envolvidos na possível transação sob pena de contrariar o princípio do interesse público, tendo em vista o valor de cerca de R$ 400 bilhões que a Eletrobras já investiu em sua rede ao longo de 60 anos de história.
  8. Nos últimos anos, a Eletrobras passou por grande reestruturação promovendo a privatização das distribuidoras federalizadas, cortes de custo, redução de 45% do seu quadro de pessoal e, ainda que pagando dividendos e realizando R$ 80 bilhões de investimentos nos últimos 8 anos, conseguiu expressiva redução de sua dívida, o que demonstra, com números auditados em balanço, a pujança de uma empresa que consegue se reerguer e gerar caixa após a redução de cerca de 50% de suas receitas em 2012. Todas essas medidas foram tomadas para se adequar à nova realidade regulatória. O resultado desse aumento de eficiência já aparece de forma consistente em 2018 e 2019, apresentado a seguir.
  9. No exercício de 2018, a Eletrobras registrou um resultado positivo de R$ 13.3 bilhões de reais. No primeiro semestre de 2019, de R$ 6.6 bilhões de reais. Ademais, a Companhia apresenta níveis de endividamento (Relação Dívida Líquida / EBITDA) menores que 3, um excelente indicador para agentes do mesmo segmento. A partir desses números, com uma simples análise econômica, percebe-se que a empresa já passou do ponto ótimo de sua estrutura de capital, indicando a possibilidade de se alavancar novamente e realizar novos projetos e investimentos, inclusive num cenário de juros baixos.
  10. Ainda em 2019, a Eletrobras registrou nota máxima no índice IG-SEST, que reflete as melhores práticas de governança e transparência, demonstrando o compromisso com a evolução de seus controles internos e consequente lucratividade.
  11. Importa dizer que o Brasil ainda carece de políticas regulatórias e fiscalizatórias eficientes no setor de Energia Elétrica que protejam os consumidores. A presença de um player privado com o tamanho da Eletrobras poderá com facilidade manipular o mercado (price maker), ainda que o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) seja o responsável pelo despacho de carga. A imaturidade da ANEEL e medidas de governo que enfraquecem as agências reguladoras contribuem ainda mais para esse risco. Há exemplos no exterior, como Leste dos EUA, Portugal e Argentina nos quais houve manipulação e explosão das tarifas.
  12. Evidência plena das falhas de regulação e controle no país se deu com os desastres seguidos de Mariana e Brumadinho da Vale, uma corporation privatizada nos anos 90. A Eletrobras possui mais de 200 barragens em bom estado de vigilância cujo risco se ampliaria com a sua capitalização. Em complemento, estamos vendo países com regulação avançada como Inglaterra e Alemanha reestatizando empresas de serviço público. A população entende que essas companhias pioraram os serviços, cobraram caro e não reinvestiram seus lucros na expansão da rede.
  13. O argumento de que a Eletrobras necessita ser capitalizada para crescer é frágil. Uma rápida análise nos seus indicadores de lucro, dividendos, endividamento demonstra que, caso fosse do interesse de seus acionistas, a Companhia poderia estar investindo muito mais. Entretanto, a opção do controlador no momento é priorizar o repasse de dividendos.
  14. Questionamos com veemência a afirmação de representantes do Poder Executivo de que a Eletrobras precisaria de R$ 12 bilhões por ano e essa seria a justificativa da necessidade da privatização. A missão da Eletrobras é regida pelo Art. 173 da CF/88, agir na defesa da segurança nacional e pelo interesse coletivo nas instalações sensíveis e estratégicas do país, não havendo a exigência de manter seu market share. Sob nosso ponto de vista, os investimentos realizados nos últimos anos comprovam que a Eletrobras permanece participando de forma significativa e abrindo espaço para a participação dos investimentos privados no setor elétrico. Ademais, não há garantias de que após capitalização, tal valor arbitrado seria investido.
  15. A narrativa de que o governo teria que retirar esse montante de saúde e educação para alocar na Eletrobras é extremamente tendenciosa e sensacionalista, os números provam isso. Na última década, a Eletrobras sim, destinou seus mais de R$ 15 bilhões de dividendos à União, além de subsidiar tarifas e grandes empreendimentos. Se generalizássemos esse raciocínio, qualquer gasto do governo poderia, então, ser encarado como perda de oportunidade de investimento em saúde e educação.
  16. Analisemos então o comportamento dos agentes no mercado de energia elétrica. Por um lado, os investidores privados têm participado de todos os últimos leilões de pequenos e médios empreendimentos promovidos pela ANEEL, mostrando que não há necessidade da presença da Eletrobras nesses casos. O setor é maduro e sustentável.
  17. Por outro lado, os últimos grandes empreendimentos estruturantes de geração e transmissão que demandam bilhões de investimentos, logística e know-how só foram viabilizados pela participação minoritária das subsidiárias da Eletrobras. Nesses casos, o investidor privado decide pela mitigação dos riscos realizando a obra em parceria com um agente estatal. São os casos das usinas de Teles Pires, Sinop, Belo Monte, Santo Antônio, Jirau e corredores de transmissão do Madeira e Belo Monte. O Brasil ainda precisará desse modelo para a exploração dos últimos grandes aproveitamentos hidrelétricos, como Tapajós e Bem Querer.
  18. Ressaltamos que a injeção de dinheiro privado no Tesouro para o simples arremate de empreendimentos já construídos e performados não agrega valor ao avanço da infraestrutura do país. O investidor privado deve ser incentivado a participar da construção de novas instalações.
  19. Essas são evidências de que o Governo deve promover a participação de investimentos privados individualmente nos novos empreendimentos ou em grandes obras em parceria com as empresas do Grupo Eletrobras. O gasto com a capitalização da Eletrobras seria um desperdício da oportunidade de promover a expansão do setor pela troca da injeção de R$ 12 bilhões no Tesouro (frente a um déficit de mais de R$ 100 bilhões) e do aumento da tarifa de energia aos consumidores através da descotização das usinas afetadas pela MP579/2012.
  20. O mérito dessa decisão necessita ser discutido com a população e seus representantes. As últimas pesquisas mostraram que entre 60 e 70% da população é contra a privatização pelas péssimas experiências recentes. Pode-se citar a queda da qualidade nos serviços da CELG (atual ENEL-GO), as tarifas elevadas e falência de empresas de telecomunicação como a Oi, a negligência da segurança em prol do lucro nas tragédias da Vale.

Permanecemos à disposição de Vossa Excelência no auxílio técnico sobre questões aderentes ao tema, levando em conta nossa experiência no setor, responsabilidade, nacionalismo e a representatividade dos empregados, familiares e consumidores de energia elétrica.


Assinam esta Carta os Conselheiros de Administração submetidos ao crivo e requisitos de idoneidade, formação e notório conhecimento das Lei das S/A, Lei de Responsabilidade das Estatais, Lei da Ficha Limpa, e à legitimidade do corpo técnico das empresas do grupo Eletrobras.

Luiz Eduardo dos Santos Monteiro – Conselheiro de Administração da Eletrobras

Gleide Almeida Brito – Conselheira de Administração da Eletronorte

Deunézio Cornelian Júnior – Conselheiro de Administração da Eletrosul

Felipe Sousa Chaves – Conselheiro de Administração de Furnas

Robstaine Alves Saraiva – Conselheiro de Administração da Chesf

Paulo Artur Pimentel Tavares de Silva – Conselheiro de Administração da Eletronuclear

Dirceu Furini – Conselheiro de Administração da CGTEE

Alberto Arkader Kopiler – Conselheiro de Administração do CEPEL

Alfran Gomes de Araújo Parente Filho – Conselheiro de Administração da Amazonas GT

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